O que significa "Babilônia em Chamas"?


Várias músicas de reggae usam a expressão “babilônia em chamas” nas suas letras. Mas o que isso significa?

Babilônia não existe mais! Bem, o antigo império babilônio corresponde atualmente ao território do Iraque e muitos podem pensar que é sobre esse país que as musicas falam. Mas não é nada disso! A expressão “babilônia em chamas” é inspirada na bíblia cristã e, mais especificamente, no livro do Apocalipse (onde se lê "caiu caiu a grande Babilônia"). No capítulo 18 deste livro, o apóstolo João, preso na ilha de Patmos por pregar sobre Jesus Cristo, diz que a ira de Deus iria destruir com um incêndio essa cidade chamada Babilônia, onde os cristãos foram perseguidos e mortos. Aqui não estamos falando propriamente do império babilônico, mas de uma cidade metafórica que representa um estilo de vida, ou uma cultura anticristã, contrária aos mandamentos cristãos. No livro, podemos ler o seguinte trecho:

“Por isso, em um só dia, sobrevirão seus flagelos: morte, pranto e fome; e será consumida no fogo, porque poderoso é o Senhor Deus, que a julgou.” Ap, 18:8

Outro trecho diz o seguinte...

"Então, vendo a fumaça do seu incêndio, gritavam: que cidade se compara à grande cidade?” Ap, 18:18

Várias canções usam expressões relacionadas a essa profecia, como “ira de Jah”, “sistema babilônico” ou “babilônia engana”. Até aquela do “nego é cabeça de gelo” fala isso... E é ai que se pode ver a estreita relação entre as culturas cristã e rastafari que existe no Reggae. O reggae é inspirado na cultura rastafári que surge na Etiópia tendo como messias o príncipe Tafari (Ras significa príncipe em etíope). A crença de que “Ras Tafari” seria um messias, como uma encarnação do deus hebraico (Javeh) delimita as influências que o reggae vai assimilar mais tarde com grandes artistas como Bob Marley. A expressão Jah (como se vê no nome da banda Tribo de Jah) vem justamente desse contexto de sincretismo cultural e religioso. Jah é um dos nomes do deus hebraico e pode ser encontrado no velho testamento na expressão “Hallellujah”, que significa “gloria a Deus”.

Voltando ainda mais no antigo testamento, vemos que hebreus e babilônios foram inimigos históricos. Só pra começo de conversa, a cultura dos dois povos era extremamente diferente em estilo de vida e religião. Hebreus eram monoteístas e babilônios adoravam vários deuses, como Baal e Marduk, rei dos deuses. Na bíblia podem-se encontrar vários sinais de repúdio ao modo de vida da Babilônio, como nas histórias de Sansão. De maneira que se pode concluir que o “sistema babilônico” representaria no universo do reggae um modo de vida errado, inadequado para alguém que confia em Jah. Isso se torna ainda mais forte quando se descobre que a cultura rastafári, que em muito contribuiu para a identidade do reggae, prega um afastamento do mundo, uma renúncia da vida mundana.

Além desse contexto, temos um fato curioso na história de conflitos entre os dois povos. Acontece que durante o reinado de Nabucodonosor II, o povo judeu foi derrotado pelos babilônicos e levado para um cativeiro na Babilônia, suas crenças foram criminalizadas e seu povo escravizado. Diversas narrativas e elementos da crença hebraica foram novamente submetidos a um teste horrível, assim como no período da escravidão no Egito. Histórias como a de Jó, que suportou muito sofrimento sem perder a fé, passaram por mudanças com os sacerdotes que viveram durante esse período. Você pode imaginar o que é ter fé quando você é um escravo de um povo que tem outra religião? Da mesma maneira que, mais recentemente, podemos testemunhar os prejuízos culturais que os negros africanos sofreram com a escravidão no Brasil, sendo proibidos de vivenciar seus cultos pessoais, podemos pensar em como o hebreu daquela época foi marcado pela influência dramática da dominação babilônica.

 Enfim, esse é o contexto cultural e religioso por detrás da expressão “babilônia em chamas”. Ficou claro pra você? Me fala qualquer dúvida ai!

Talvez algum fã de reggae possa discordar dessa tese, mas as referências são inegáveis. Em que outro contexto essa expressão teria fundamento? O que os compositores do reggae realmente querem dizer com ela? Pra mim, o uso dela como resultado de um sincretismo que mistura elementos cristãos, judeus, etíopes e jamaicanos se mostra claro como o dia. Alguém pode até não reconhecer esses elementos, mas basta visitar o capitulo 18 do Apocalipse. Então, não viva como os babilônios. Viva Jah!

Comentários

Unknown disse…
Complementando, reduzidamente, às explanações citadas no texto:
"Fogo na babilônia" também quer dizer total descontentamento com o nosso (des)governo brasileiro, com a pobreza, corrupção, etc, que fazem o povo brasileiro de escravo. (ta aí a relação no trecho do texto: "... Acontece que durante o reinado de Nabucodonosor II, o povo judeu foi derrotado pelos babilônicos e levado para um cativeiro na Babilônia, suas crenças foram criminalizadas e seu povo escravizado..."
Jorge Marques disse…
Muito bem! Concordo...
Anônimo disse…
Muito boa colocação!
l0x_x0ll0x_x0l disse…
Obrigado meu amigo de verdade
Juli disse…
Essa observação é muito atual...
Entendo "fogo na Babilônia" como um grito de liberdade, de repúdio à hipocrisia dos pseudo-governantes, que durante anos massacram um povo refém de suas mazelas, e de repúdio às praticas racistas e discriminatorias. Eu sou o LACERDA GUERREIRO, compositor e cantor da banda LORD REGGAE, do Rio de Janeiro. JAH LIVE
Unknown disse…
Até onde eu sei babilonia chamas significa fumar um cigarro do capeta, isso na gíria dos regueiros
Anônimo disse…
Tá sabendo errado! E não é do capeta!
Unknown disse…
Queima Babilônia !!! Queima !!!
Muito relevante a sua colocação.
Viva!
Anônimo disse…
Isso é gíria de maconheiro
David disse…
Parabéns pelo texto, adorei muito explicativo.
Anônimo disse…
BABILÔNIA: foi capital da principal potência da Mesopotâmia e, nesses períodos, é possível que tenha sido a maior cidade do mundo, na qual existiam alguns dos monumentos mais impressionantes da Antiguidade. Babilónia tornou-se um destacado centro económico e cultural, desenvolvendo uma civilização complexa, sofisticada e cosmopolita, documentada por muitos registos arqueológicos que atestam o cultivo da educação, do comércio, da ciência, de diversas técnicas e da arte, florescendo num vasto conjunto urbanístico cortado por canais e rico em monumentos, templos e edificações imponentes. No início do período islâmico, no século VII, não era mais do que uma pequena aldeia no meio de extensas ruínas. A palavra Babilônia provém do grego e quer dizer “porta dos deuses”. A babilônia na linguagem cultural quer dizer grande cidade, grande sistema econômico, liberdades e talvez libertinagens. Liberdade religiosa (confusão), pluralidade política (confusão), liberdades em todos os sentidos e o mais importante: o Capitalismo. Fogo na babilônia gritam aqueles que não sabem o que estão dizendo. Seria atear fogo nas grandes cidades e no multiculturalismo (direito por exemplo de cultuar vários deuses).
Anônimo disse…
FOGO NA BABILÔNIA: Fumar maconha.
Anônimo disse…
Melhor explicação

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